Recebi há alguns dias atrás uma mensagem de uma mãe. Ela estava um pouco angustiada com o comportamento de seu filho caçula. Ela descreveu as diferenças visíveis entre os seus dois filhos, o mais velho de oito anos e o mais novo de um ano e meio. Foi muito enriquecedor trocar idéias com esta mãe e poder ajudá-la um pouco esclarecendo as suas dúvidas.
Pensando em compartilhar com outros pais que por ventura tenham as mesmas dúvidas, essa mãe autorizou postar o nosso diálogo neste Blog. Agradeço a ela pela gentileza.
Abaixo, descrevo o nosso diálogo:
Mãe: “O mais velho é um doce, sempre foi super tranquilo e nunca me trouxe preocupações. O mais novo nasceu prematuro, de 36 semanas, e desde pequeno sempre me deu muito trabalho. Sempre foi muito chorão, dormia muito mal. Com apenas dois meses de idade não dormia durante o dia, tirava apenas cochilos. Não tem paciência pra nada. Trocar a fralda é uma tarefa muito difícil de ser realizada. Desde que ele completou um aninho e começou a andar as coisas pioraram muito, agora ele não para um minuto, parece que não se cansa nunca. Ele dorme muito mal. Durante a noite ele acorda muitas vezes e tem o sono muito agitado, chegando a ter olheiras, mesmo assim, acorda com toda disposição. De uns meses prá cá, o comportamento dele tem mudado: além de dormir muito mal, ele tem demonstrado um comportamento agressivo com ele mesmo. As vezes puxa os próprios cabelos, morde as mãozinhas e, quando fica nervoso com alguma coisa costuma bater com a cabeça no chão, ou no sofá. Ele também morde com muita força a chupeta, demonstrando muita ansiedade e nervosismo. Pra viajar com ele é um sacrifício, isso porque ele se solta da cadeirinha do carro e corre para o banco da frente. Em casa ele corre bastante, é muito estabanado, cai a toa e vive todo cheio de hematomas. É muito impulsivo, faz as coisas sem demonstrar qualquer medo, se joga de cima da cama, pula, fala, canta o tempo todo, mexe em tudo, a casa vive de cabeça para baixo. Na hora de comer é um sacrifício, ele vai muito bem nas primeiras colheradas, mas logo se cansa de ficar sentado e sai correndo. Ele atrapalha muito o irmão mais velho nas brincadeiras e atividades e isso me traz grandes conflitos. O comportamento é igual em qualquer lugar, confesso que ultimamente tenho deixado de frequentar certos lugares, porque volto pra casa exausta de tanto correr atrás dele.
Bem, diante desses sintomas, a pediatra disse que acha essa agitação um pouco excessiva pra idade dele. Ela me aconselhou a colocá-lo na natação pra ver se ajuda um pouco e também me pediu que procurasse um neurologista para fazer uma avaliação mais precisa. Eu gostaria de saber sua opinião sobre o caso dele. Andei pesquisando muito sobre a hiperatividade, e mesmo ele sendo muito pequeno, acho que ele já apresenta muitos sintomas, mas o que você acha?”
O seu filho caçula, pelo que você descreve, é bem inquieto, o que não necessariamente o torna Hiperativo. Para um diagnóstico de hiperatividade, é preciso a avaliação de uma equipe multidisciplinar, pois o tratamento envolve medicação o que, para crianças muito pequenas, precisa ser cuidadosamente avaliada a real necessidade. Ele precisa da avaliação de uma Neuropsicóloga, psicóloga, psicopedagoga e neurologista. O diagnostico de um único profissional não é suficiente para uma avaliação com resultado preciso, exatamente porque muitos confundem agitação excessiva, que pode ser gerada por outros fatores, com hiperatividade. O cuidado nesta avaliação é fundamental.
Pelo que você descreve, ele não dorme bem e é muito agitado comparado ao irmão. Primeiro ponto: nunca faça comparações, pois isso fará você sempre acentuar as diferenças entre eles. Eles são diferentes, como a maioria dos irmãos. Imagine se o caçula tivesse nascido primeiro, provavelmente você o enxergaria de outra forma, pois você não teria uma referência comparativa. Pense em cada um de maneira única e individual. O fato de serem diferentes não os torna certos ou errados, apenas diferentes.
Alguns comportamentos que você descreve são perfeitamente normais para a idade dele, tipo:
- "Não parar um minuto" - a maioria dos meninos são pequenos aventureiros e querem descobrir o mundo no menor tempo possível, eles só não sabem que tem limitações, o que os torna agitados e irritados.
- "Ser chorão" - o choro é uma expressão da criança que precisa ser respeitada e entendida. Ele pode significar muita coisa. Em crianças muito pequenas, é a maneira que eles têm para dizer que estão insatisfeitos com algo ou alguma coisa. Tente escutar o choro como uma fala. O que ele poderia estar lhe dizendo ao chorar?
- "Dormir mal" - Criar um ambiente tranquilo é fundamental, isso inclui o ânimo dos pais. Estejam tranquilos e calmos para que ele se sinta seguro para dormir. Algumas crianças tem medo de dormir, pois acham que vão ficar sozinhas, porque é escuro, etc. Por isso as crianças em geral, precisam de segurança para entenderem que dormir é seguro e faz bem.
- "Não tem paciência para nada, trocar fralda, etc" - Nesta idade a paciência não é uma virtude. Eles são impacientes mesmo. O contrário é que é fora de regra.
- "Bater a cabeça no chão" - também é comum nesta idade, pois é uma maneira de chamar a atenção para o que ele quer. Ignore que logo passa, e não se preocupe que ele não irá se machucar. Eles batem a cabeça, mas sabem o limite da dor e não se machucam. Uma maneira de ignorar é sair de perto e quando ele se aproximar, tente mudar de assunto, tipo oferecendo uma comidinha, um brinquedo, aja como se nada estivesse acontecendo.
- "Viajar com ele é difícil" - Ele precisa de limites e saber o que precisa ser feito para a sua segurança. Crianças muito pequenas aprendem rápido sobre limites e são os pais que vão ensinar. Use um cinto que realmente prenda ele à cadeira e converse dizendo calmamente que ele terá que ficar ali e que não poderá vir para o banco da frente, pois pode se machucar (fazer dodói). Repita isso quantas vezes for necessário, mas sempre com tom de voz baixo e calmo. A calma é fundamental na educação dos filhos.
- "Faz coisas sem demonstrar medo" - A sua autodefesa não está ativada e ele não demonstrará medo mesmo, até mesmo porque ainda não tem. Somente por volta dos três anos é que começará a apresentar medo. Crie ambientes seguros e tome mais cuidado ao sair com ele. Logo, logo ele terá algum medinho.
- "Fala e canta o tempo todo, mexe em tudo, a casa vive de cabeça para baixo" - Que fofo!! Ele precisa de um lugar seguro para brincar. Crie no quarto dele ou em um canto da casa um lugar com tapete de EVA, piscina de bolas, bastante almofada e brinquedos de montar e desmontar para ele se entreter. Ele precisa disso e é do temperamento dele ser um pouco mais agitado que o seu filho mais velho, até mesmo pela idade, características pessoais, etc. Ensine-o que quando tirar algo do lugar, ele deve colocar de volta. A criança aprende por repetição, então repita esse comando quantas vezes forem necessárias.
- "Na hora de comer é um sacrifício, ele vai muito bem nas primeiras colheradas, mas logo se cansa de ficar sentado e sai correndo" - Criança não deve ser obrigada a comer. Se ele vai bem nas primeiras colheradas e sai correndo, significa que já está satisfeito. Pare de dar comida nesta etapa. Quando ele sair correndo, pare a comida! Ele vai aprender que se quiser comer mais, vai precisar ficar sentado. Encare cada atitude dele com mais tranquilidade, com fome tenha certeza que ela não ficará. Ele aprenderá a lhe pedir comida e a respeitar estes momentos, só que com naturalidade.
- "Ele atrapalha muito o irmão mais velho nas brincadeiras e atividades e isso me traz grandes conflitos" - Preserve o espaço de seu filho mais velho. Isso é fundamental para que eles sejam amigos irmãos. O pequenino precisa respeitar o tempo e o espaço do irmão. Isso é bom para a auto-estima dos dois. Nunca use a frase: "Você é mais velho e tem que entender...". Eles odeiam e não ajuda em nada. O pequenino tem que brincar com seus brinquedos e no seu espaço e, quem sabe em alguns momentos, brincar com o irmão, mas só em alguns momentos.
- "O comportamento é igual em qualquer lugar, confesso que ultimamente tenho deixado de frequentar certos lugares, porque volto prá casa exausta de tanto correr atrás dele" - Infelizmente isso faz parte. E para que as coisas fiquem diferentes, você terá que discipliná-lo. Tem um livro bem fácil de ler que é "Domando a sua ferinha", nele você encontra dicas bem legais sobre como agir em lugares públicos. Vale a pena dar uma olhadinha.
- "Tem o sono agitado" - Se ele tem um dia agitado, terá sono agitado. Um é reflexo do outro.
- "É agressivo com ele mesmo" - Ele ainda está na fase oral, onde tudo é conhecido pela boca. Então levar objetos à boca, se morder, etc, pode ser uma maneira de chamar atenção e de se expressar. O universo que ele conhece é ele mesmo, então é nele que serão manifestados muitos comportamentos. Se ele se morde e com isso tem a atenção de todos, ele o continuará fazendo. É o mesmo principio de bater a cabeça. Aja da mesma forma.
- "Morde a chupeta com força" - Fase oral, recursos orais. Morder, chupar, engolir, etc.
Bem o que você descreve sobre o seu filho caçula não são sintomas, mas sim comportamentos. Os sintomas caracterizam uma patologia e os comportamentos um jeito de ser que pode perfeitamente ser modificado. Não se preocupe tanto. Ela está manifestando muitos comportamentos comuns à idade. O que ele precisa é de orientação para os seus comportamentos, disciplina para as suas atitudes e lugar seguro para se expressar, conhecer e explorar o mundo ao seu redor. Acredite, ele tem mesmo muita energia e precisa de mais espaço para manifestá-la.
Para você ficar mais tranquila, procure a consultoria de uma educadora ou psicóloga infantil. Marque uma sessão para você e procure orientações, isso vai deixá-la mais calma e segura para educar com tranquilidade e segurança os seus filhos.
Abraços,
Lila