O caso do menino de 10 anos que atirou na professora e em seguida se matou com um tiro na cabeça, entristeceu o Brasil e provavelmente levou muitos pais à reflexão sobre o que vem acontecendo com as nossas crianças e jovens.
Lamento pela profunda tristeza desses pais e pela dor silenciosa dessa criança que se matou.
Infelizmente o suicídio tem sido uma infeliz escolha para a “solução” dos problemas de muitos jovens. Aqui no Canadá, ele é a segunda principal causa de morte entre eles.
Em junho do ano passado, seis jovens se suicidaram em uma pequena cidade no país. As vítimas tinham entre 14 e 20 anos. Nenhum deles se conhecia. Esse fato nos chama a atenção para a complexidade do suicídio, que não se limita a um "tipo" psicológico ou a uma circunstância em particular. O suicídio de jovens continua sendo um enigma enlouquecedor. Muitas famílias ainda estão tentando entender por que seus filhos fizeram essa terrível escolha e o que eles poderiam ter feito para evitá-la.
O início e o final do ano escolar podem ser particularmente vulneráveis para jovens em risco, pelo menos é o que dizem alguns estudos. De acordo com a psicóloga da Universidade de Ottawa Darcy Santor, pelo menos 91% das vítimas de suicídio sofrem de alguma forma de doença mental no momento de suas mortes. O perigo aumenta quando mais fatores de risco estão presentes, como: a vergonha, depressão, ansiedade, abuso de álcool, o bullying, isolamento social e dificuldades de aprendizagem.
Lembro-me de um menino de 11 anos que atendi há alguns anos atrás. Ele tentou se suicidar, pulando do quarto andar da sua escola no dia de uma determinada prova. Felizmente ele não morreu, ficando apenas bastante machucado. Ele me contou que estava nervoso com a prova e que seus pais o pressionavam para ele obter boas notas. A parte mais impressionante do seu relato foi que antes de pular, ele apenas sentiu um enorme desespero e não via outra saída senão morrer.
Afinal, porque as crianças e os adolescentes não batem na nossa porta para pedir ajuda? Porque mantém a sua dor em segredo? Talvez, tenhamos aqui uma resposta: “Nós não falamos isso para os nossos pais, eles não entenderiam”, disse certa vez outro adolescente que conheci. Ele tentou suicídio por duas vezes.
Será que as nossas crianças estão se matando porque estamos indo sentar em silêncio na frente da nossa TV ou do nosso computador e deixando que os nossos filhos se resolvam sozinhos? Esta é uma pergunta intrigante!
No Canadá, muitas pesquisas são realizadas no campo das doenças mentais e em particular, com o tema suicídio. Patrice Corriveau, pesquisador da Universidade de Ottawa, vem analisando e catalogando cada nota de suicídio deixada. Na sua pesquisa, ele voltou no tempo - mais de 100 anos. Isso foi possível, pois na província, uma investigação forense é obrigatória para todos os casos de suicídio. Ele descobriu, por exemplo, que no final de 1800, muito antes de "adolescente" ser uma categoria social reconhecida, os jovens com maior probabilidade de morrer por suicídio eram as meninas solteiras que se encontravam grávidas. Na década de 1930, foram os jovens da Europa, que não conseguiam encontrar a sua fortuna na nova terra ou jovens maridos que perderam suas fortunas e se mataram por vergonha. Com essa pesquisa, pode-se perceber que a atual situação de morte por suicídio entre os nossos jovens é um fenômeno mais recente.
O que vem acontecendo com os nossos jovens?
Muitos pais não percebem o declínio emocional que os seus filhos vêm passando. Já escutei de muitos a seguinte frase: “Nunca percebemos nada, ele(a) era tão tranquilo” O que me parece é que os pais simplesmente não são ensinados sobre o que procurar no comportamento dos seus filhos que dêem indício de uma profunda dor psíquica e do desejo de morte.
Algo que realmente me preocupa, é que as crianças e principalmente os adolescentes, são estigmatizados pela sociedade. No Brasil, os jovens carregam nas costas o infeliz apelido de “aborrecente”. Toda essa carga de rótulos e preconceitos com relação a essa fase da vida tem dificultado a nítida visão do que pode estar acontecendo dentro desse universo juvenil.
Alguns pais não levam a sério o que os filhos estão passando, pois acreditam ser uma fase de angústia da adolescência, mas muitas vezes é uma forma mais profunda de depressão e ansiedade.
Certa vez escutei de uma menina de 13 anos a seguinte frase: "Eu não posso voltar atrás e consertar as coisas." Os adolescentes, assim como as crianças, pensam diferente dos adultos. Para eles, o que existe de mais concreto na vida é o aqui e agora. Falar sobre o futuro pode parecer utópico.
Pesquisas mostram que muitos jovens que se mataram, comentaram com os amigos e parentes, sobre o desejo de suicidar-se e não o fizeram apenas uma vez e sim várias. Foi como um pedido de socorro. Um triste exemplo disso foi o pequeno garoto brasileiro citado no início do texto. Ele disse aos amigos o que iria fazer, mas ninguém levou a sério. Pensaram que era brincadeira.
Em 2001, pesquisadores em Houston entrevistaram 153 jovens entre 15 e 24 anos que haviam sobrevivido a uma tentativa séria de suicídio. Eles foram convidados para estimar a quantidade de tempo entre o momento em que tinham decidido que queriam morrer e quando eles de fato o fizeram. Em 70% dos casos, o tempo foi menor que uma hora. Em 25% foi apenas de cinco minutos.
Um fato que não pode ser desconsiderado é que vivemos em uma sociedade cada vez mais competitiva, com tecnologia de ponta ao nosso alcance, com muita informação, muito mais do que damos conta de assimilar. O mundo está dinâmico e com isso as exigências sociais aumentaram. Precisamos correr se não quisermos “parar no tempo” e com isso, percebemos que muitos jovens não sabem como lidar com a perda, a frustração e a decepção. Não sabem por que não aprenderam, não foram ensinados a relaxar, a se permitir a errar, a descobrir o seu potencial que é individual e único. Precisamos ensinar isso aos nossos filhos!
Gostaria de fazer um pedido a todos os pais: Olhe para os seus filhos, observe que o mundo deles muda de acordo com a idade, respeite cada fase e aprenda coisas novas através de conversas amigáveis, permita que eles sejam únicos. Não deixe para fazer isso amanhã, comece hoje no seu próximo encontro com eles.
Abraços,Lila